«Desconfiem sempre de gente com sobrancelhas finas e mal arranjadas. Eu até consigo perceber as velhas damas que entram no eléctrico agarradinhas à mala e, envoltas em naftalina e colónia (renovada pelo filho todos os Natais), se apresentam de sobrancelha quase inexistente sublinhada por um lápis que nitidamente foi desviado da rota pensada. O lápis escuro ofusca o raros pêlos que o tempo apagou. Eu, que nunca me separo do batom e do lápis, posso muito bem tornar-me numa senhora destas, mas só se a queda da folha me levar também as sobrancelhas. Nunca as arranjei e não me vejo a pôr-lhes a pinça em cima. Como dizia, consigo perceber estas velhas damas do lápis esquizofrénico, mas compreender que uma marmanja nova decepe os pêlos que são um porto de abrigo dos olhos, isso já não aceito nem compreendo. Com o devido respeito pelos subúrbios, tipa que se apresente com sobrancelha muito aparada não pode ser senão suburbana. Pensem nas mulheres que admiram e nas que têm sobrancelhas finas. Com excepção da Greta Garbo e de outras raparigas do seu tempo, não me parece que haja algum exemplar que mereça um elogio. Porque é que as mulheres de hoje gostam de pinça? Não há explicação. Diz-se que "abre mais o olhar", mas está tramado quem acata o conselho: tem exercício para o resto da vida. Acordar com uma mulher na cama que de repente tem barba nas sobrancelhas é chato. Os pêlos crescem sem piedade, e se na região púbica ainda se podem esconder, nos olhos é mais complicado. Como sabem, também há machos que gostam de pinças, mas apesar de poderem fazer o gosto ao dedo, escolhem a cera. Depilam o corredor central e normalmente deixam as artérias laterais intactas. Nem todos. Já vi meias-luas em muito bom homem. Normalmente, estes exemplares podem ser encontrados em ginásios, espaços de 'striptease' ou discotecas de província. O Cristiano Ronaldo (que acho muito foleiro) também as arranja. Não sei se pede à irmã ou se vai às melhores esteticistas inglesas, mas o resultado é igualmente mau. Eu, que me considero uma mulher arejada e (quase) sem preconceitos, jamais aceitaria um homem que me aparecesse de sobrancelha rapada (o método de remoção pouco importa). Já o disse antes, mas volto a frisar: gosto de pêlos nos homens. Aceitaria mais depressa o Tony Ramos que o Cristiano. Pôr areia nas costas do Tony havia de ser uma diversão... Mas voltemos às mulheres, às tais que se denunciam pela sobrancelha. Vem esta crónica a propósito do livro de que meio mundo fala. Se o livro é grotesco pela forma como tudo é revelado (independentemente de vir a confirmar-se, ou não, o que lá está escrito), pior consegue ser a imagem dessa mulher de sobrancelha mal amanhada. Vejam-na no papel de vítima com ar deslavado, enquanto fala devagar e fecha mais o olho esquerdo que o direito. Qualquer bom católico (mesmo que seja do Benfica) devia sentir-se ofendido pelo cenário que foi escolhido para a narradora da obra se explicar à televisões: uma árvore de Natal - símbolo de harmonia e união familiar. Gente como a minha prima Lucinda (muito tocadas pela época que atravessamos) dirá: "tadinha da moça. Olha que não tebe sorte nenhuma. Mas é honrada e até fez o pinheirinho pra ela e prós meninos". Não me interessa o passado da rapariga e muito menos o presente. A verdade é que, estando nas televisões e nos jornais todos os dias, esta cara pouco laroca aparece-me sem pedir licença e não consigo deixar de olhar para aquelas sobrancelhas. Se há quem diga que os olhos são o espelho da alma, eu arrisco escrever que as sobrancelhas são o reflexo do carácter. Pobre da mulher que nunca será uma dama. "Oh God, make me good, but not yet!"» Este artigo foi retirado da revista NS', o suplemento do Diário de Notícias. A frontalidade com que se fala nas sobrancelhas e, como e quem as arranja, não me deixou indiferente... é simplesmente verdade! Abaixo ao efeito 'ouriço' ahahahah!
sábado, dezembro 23
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